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domingo, 17 de dezembro de 2023

SOCIOLOGIA e PSEUDOMARXISMO - IDEOLOGIAS BURGUESAS

 


Assim como a sociedade capitalista não emergiu “da noite para o dia”, pois precisou de um extenso processo histórico de constituição (três séculos aproximadamente), a episteme burguesa também não nasce pronta, uma vez que sua consolidação dependeu da consolidação da própria sociedade capitalista. Sua primeira fase de constituição foi elementar, porém, com a sucessão do regime de acumulação extensivo para o regime de acumulação intensivo (ORIO, 2020) a episteme burguesa ganha corpo e adquire uma forma mais desenvolvida.

Nesse mesmo regime de acumulação, emerge também o movimento revolucionário do proletariado e, por conseguinte, a constituição da episteme marxista. A existência dessa pressionará a burguesia a sistematizar uma política cultural antagônica à radicalização política dessa classe social e à episteme que a expressava teoricamente. Não gratuitamente, a maior obsessão da Sociologia (ideologia burguesa), tanto da clássica que nascia, quanto da contemporânea, foi e é a de promover uma desqualificação da suposta teoria marxista, suposta pois a academia mal conhece a produção teórica de Karl Marx, quando muito, o criticam através da leitura de suas caricaturas ideológicas pseudomarxistas ou de supostos críticos e seus mantras psittaciformes[1].

A episteme burguesa veio se constituindo historicamente, desde a emergência da classe burguesa no século XVI (Renascentismo), e consolidou seu primeiro paradigma nos fins do século XIX, com o desenvolvimento do positivismo. Apesar de suas bases serem oferecidas pelo iluminismo e pelo romantismo nas discussões mais abstratas, sua grande fonte inspiradora para o plano concreto foram as Ciências Naturais que, a partir de então, ganha grande credibilidade, status de conhecimento científico, reconhecimento intelectual, respeitabilidade, valores, interesses e disputas próprias da esfera científica (VIANA, 2019).

O positivismo hegemônico nas Ciências Naturais torna-se o “espírito da época” com seus campos mentais, axiomáticos, linguísticos, analíticos e seu modo subjacente de pensar próprio, que se propagandeará por um determinado tempo na sociedade capitalista. Para esse paradigma, o que conta é a ideia de positividade enquanto um saber científico objetivo (objetividade) e neutro (neutralidade) diante da realidade a ser investigada.

A partir do positivismo emergirá diversas novas ciências, tal como as Ciências Humanas no século XIX, que estabelecerá, em sua versão original e sociológica (Comte e Durkheim) uma unidade metodológica entre Ciências Naturais e Ciências Humanas. A força hegemônica do paradigma positivista no regime de acumulação intensivo não poupou nem mesmo aqueles intelectuais que passavam a se autointitular “marxistas”.

A ideologia pseudomarxista foi inicialmente sistematizada por Karl Kautsky (1854-1938), contudo o que um estudo pormenorizado da sua biografia, dos seus vínculos políticos (social-democracia), das suas influências intelectuais (Darwin, Henry T. Buckle, Andrew Lang, Engels[, todos positivistas e o último positivista e social-democrata), das suas próprias reflexões intelectuais e suas confissões apontam para uma constatação indubitável: Kautsky nunca foi marxista (MATTICK, 1988; MATHIAS, 1988).

O contato de Kautsky com o “marxismo” se dá mediado pela leitura de Engels (Anti-Dühring) e com uma forte influência do positivismo (cientificismo) em suas concepções intelectuais (PROCCACI, 1988). O aprofundamento no conhecimento da episteme marxista poderia ter levado Kautsky a romper com o positivismo. O problema é que a pré-condição para isso passaria por partir da perspectiva do proletariado, mas, não é o que ocorre, pelo contrário, a partir de seu revisionismo do “marxismo” (ideologia pseudomarxista), Kautsky produz uma ideologia que é expressão dos interesses de outra classe social, a burocracia em sua fração partidária social-democrata. Eis aqui la raison d’être da ideologia pseudomarxista.




[1] Conjunto de aves que compreende as espécies de papagaio, arara, calopsita etc., muito conhecidas por terem a capacidade de repetirem o que escutam frequentemente.


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