A
Teoria do Regime de Acumulação Integral.
O propósito desse artigo é apresentar
de forma introdutória a teoria do regime de acumulação integral elaborada pelo “sociólogo”,
militante de “inspiração conselhista”[1], professor e amigo Nildo
Viana. Tal teoria vem sendo elaborada desde o início dos anos 2000 e aparece,
ainda de forma embrionária, na sua obra Estado,
democracia e cidadania – a dinâmica da política institucional no capitalismo (2003).
Porém, somente com o lançamento da obra O
capitalismo na era da acumulação integral (2009), partindo da sua definição
de regime de acumulação e do regime de acumulação integral que já se encontrava
na obra anterior, é que o autor nos oferece uma teoria explicativa da história
do capitalismo e um conjunto de reflexões teórico-metodológicas que nos proporciona
a realização de uma análise e compreensão aprofundada do capitalismo
contemporâneo em sua totalidade.
A motivação que Viana tem para elaborar
sua teoria dos regimes de acumulação vem da constatação da insuficiência
teórica existente até então nas análises que buscaram compreender o
desenvolvimento histórico do capitalismo. Deste modo, a proposta da obra O capitalismo na era da acumulação integral
(2009) é fornecer uma teoria do desenvolvimento capitalista e sua tese central
consiste na comprovação de que o capitalismo ao longo dos séculos veio sofrendo
modificações nas suas formas, no entanto, seus fundamentos continuam os mesmos:
a produção/extração de mais-valor e a luta de classes (tanto na esfera da
produção quanto a que se encontra disseminada pela sociedade civil).
Segundo o autor, um regime de acumulação
é caracterizado pelo desenvolvimento do capitalismo em determinados períodos
históricos, sendo constituído pela seguinte tríplice: a) formas determinadas de
processo de valorização (taylorismo, fordismo, toyotismo e similares); b)
formas de organização estatal (Estado liberal, liberal-democrático, do
“bem-estar social” e neoliberal); c) formas específicas de exploração
internacional (neocolonialismo, imperialismo, neoimperialismo).
Não iremos abordar nesse capítulo todos
os demais regimes de acumulação (extensivo, intensivo, intensivo-extensivo)
anteriores ao regime de acumulação integral, mas tão somente analisar algumas
das principais características do regime anterior ao integral e sua crise para
melhor compreender o processo de constituição do regime de acumulação integral
e seu desenvolvimento.
Mas antes mesmo de entrar nessa
discussão, pretendemos, assim como Viana faz na sua obra, resgatar a discussão
acerca das múltiplas determinações que envolvem o modo de produção capitalista
e sua determinação fundamental: a produção de capitalista de mercadorias
(extração de mais-valor). É verdade que a análise da mercadoria por ela mesma
não revela o segredo da exploração capitalista, o essencial da produção
capitalista, no entanto,
este essencial não poderia ser estudado se não
tivesse previamente mostrado que a mercadoria é a forma social que tem de
revestir qualquer bem na economia capitalista. A mercadoria é o fenômeno
concreto da produção capitalista; enquanto fenômeno, ela não basta para
caracterizar o capitalismo, mas impõe a sua forma particular a todos os fatores
e produtos do trabalho efetuado nas condições capitalistas (BARROT, 1977, p. 54).
Karl
Marx foi o primeiro teórico a elaborar uma teoria sistematizada do modo de
produção capitalista, por isso é a partir dele que buscaremos compreender as
determinações desse modo de produção. O propósito de Karl Marx na sua obra O Capital (1985) consiste em revelar a
exploração da sociedade capitalista que possui seu fundamento na extração de
mais-valor no processo de produção de mercadorias. Visando compreender a
essência (no sentido ontológico) da mercadoria, Marx, a partir do “método da
abstração”, procura descobrir suas múltiplas determinações e sua determinação
fundamental.
No
capítulo A mercadoria do volume I de O capital, o autor inicia questionando o
que determina o valor da mesma. Para responder a essa questão, primeiramente,
torna-se necessário, segundo Marx, saber o que há de comum em todas as
mercadorias. Ele acaba afirmando que o que há de comum é que as mesmas são
produtos do trabalho humano e que o tempo de trabalho gasto em sua produção
está diretamente relacionado com a determinação do seu valor. No entanto, cabe
indagar como Marx chega a tal conclusão. Vejamos.
A
mercadoria é ao mesmo tempo valor de uso e valor de troca. Enquanto valor de
uso a mercadoria deve possuir utilidade para, enfim, ser consumida. Tais
valores de uso são portadores materiais do valor de troca, ou seja, são
mercadorias. Tomemos os seguintes exemplos para melhor compreender a questão
dos valores. Se 01 chinelo equivale a 03 bermudas, 05 bonés, logo 03 bermudas
vale o mesmo que 05 bonés ou um chinelo. Por conseguinte, possuem a mesma
expressão do seu conteúdo. Sendo assim, pode-se concluir que 03 bermudas e 05
bonés possuem algo de comum e da mesma grandeza, mesmo sendo, enquanto valores
de uso, coisas distintas. Percebe-se, então, que há uma “terceira coisa” além dos
valores de uso e de troca nas quais eles se reduzem. Em que consiste essa
“terceira coisa”?
As
mercadorias enquanto valores de uso possuem diferenças qualitativas e enquanto
valores de troca possuem apenas diferenças quantitativas. Enquanto valores de troca,
as mercadorias possuem apenas uma “propriedade comum”: são produtos do trabalho
humano. Assim, Marx descobre em que consiste a “terceira coisa” e afirma:
ao desaparecer o caráter útil dos
produtos do trabalho, desaparece o caráter útil dos trabalhos neles
representados, e desaparecem também, portanto, as diferentes formas concretas
desses trabalhos, que deixam de diferenciar-se um do outro para reduzir-se em
sua totalidade a igual trabalho humano, a trabalho humano abstrato (1985, p.
47).
Dessa
forma, o que se pode perceber é que as mercadorias possuem como “propriedade
comum” o fato de serem produtos do trabalho humano, “uma simples gelatina de
trabalho humano indiferenciado”, trabalho humano abstrato. Conclui-se, então,
que é o tempo de trabalho socialmente necessário para produzir uma mercadoria
que determina seu valor. Vale destacar que o autor está tratando do tempo médio
social de trabalho e não do tempo de trabalho efetivo, e trata-se do valor da
mercadoria e não do seu preço. A diferença de um valor em relação a outro é
meramente quantitativa. A grandeza quantitativa do valor é medida através do
tempo de trabalho gasto na sua produção que, por sua vez, é medido pela sua
duração (horas, dias etc.) Porém, esse trabalho é “trabalho abstrato”, ou seja,
trabalho social médio e não “trabalho concreto”. Sendo assim,
é,
portanto, apenas o quantum de trabalho socialmente necessário ou o tempo de
trabalho socialmente necessário para produção de um valor de uso o que
determina a grandeza de seu valor. A mercadoria individual vale aqui apenas
como exemplar médio de sua espécie. Mercadorias que contêm as mesmas
quantidades de trabalho ou que podem ser produzidas no mesmo tempo de trabalho
têm, portanto, a mesma grandeza de valor (Ibid, 1985, p. 48).
O trabalho humano utilizado na produção de uma
mercadoria possui duplo caráter: trabalho concreto e trabalho abstrato.
Primeiramente, o trabalho é produtor de valor de uso, produz para ser útil a
determinadas necessidades. Por outro lado, tal trabalho é abstrato, produz mais
valor, acrescenta valor à mercadoria. Tal duplicidade do trabalho se reproduz
na mercadoria como valor de uso e valor de troca. A mercadoria enquanto coisa
de valor é imperceptível. Somente representa valor quando expressa trabalho
social e, conseqüentemente, o seu valor só pode ser expresso numa relação
sócio-mercantil de mercadorias para mercadorias.
Marx compreende o concreto (real) como sendo
“síntese de múltiplas determinações”, mas que possui uma determinação
fundamental. De acordo com o “método da abstração” desenvolvido por ele, o
concreto-dado é ponto de partida, visto que antes da pesquisa ele se encontra
no nível das “representações cotidianas”, “senso comum” e não se apresenta de
imediato em sua “essência”, mas a partir das abstrações atingimos o
concreto-determinado, pensado. Isto é, no início, temos o
concreto-dado, a representação cotidiana do fenômeno a ser estudado, ou seja, a
aparência. Depois de pesquisar, através da abstração chegamos ao
concreto-pensado, determinado. Por conseguinte, o concreto-dado
é transpassado para o concreto-pensado, possibilitando expressá-lo,
teoricamente, em sua totalidade.
Nesse sentido, é que podemos afirmar que o preço da
mercadoria é o concreto-determinado, e o processo de abstração possibilitou chegar
ao valor, sua determinação fundamental. Portanto, o que Marx busca fazer no capítulo A mercadoria é superar o concreto-dado, a aparência, através da
abstração, chegando à essência – determinação fundamental - para assim chegar
ao concreto-determinado, que é a mercadoria em suas múltiplas determinações.
Resta agora sabermos que relações sociais concretas
existem entre a produção de mercadorias e a definição do valor das mesmas, ou
seja, de que forma se define o valor de uma mercadoria na sociedade capitalista?
Creio não ser necessário realizar grandes análises
para concluirmos que a produção capitalista só ocorre se a mesma for geradora
de lucro, ou seja, se a classe capitalista detentora dos meios de produção
necessita, ao produzir mercadorias, vendê-las no mercado por um valor superior
aos custos da sua produção, conseqüentemente o valor final da comercialização deve
ser maior do que os gastos com maquinaria, matérias-primas e salários, pois,
“como a própria mercadoria é unidade de valor de uso e valor de troca, seu
processo de produção tem de ser unidade de processo de trabalho e processo de
formação de valor” (Ibid, 1985, p. 155). Portanto, o trabalho deve ser processo
de valorização, pois tanto as máquinas quanto as matérias-primas apenas
repassam seus valores no processo produtivo. De onde e de que maneira, então,
vem o acréscimo de valor?
Anteriormente já foi adiantado que o valor de uma
mercadoria é determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário para
produzi-la, portanto é a força de trabalho (capital variável) o único elemento
que acrescenta valor à mercadoria, pois
a produção de capital (mais-valor convertido
em lucro) é formada por dois componentes existentes no processo de produção
denominados de trabalho morto (matéria-prima, maquinaria e tecnologia em
geral) e trabalho vivo que consiste na força de trabalho operária. O
primeiro não tem capacidade de gerar valor e apenas repassa seus custos durante
o processo produtivo, já o segundo é a única força geradora de capital, ou
seja, acrescenta à mercadoria mais do que o valor gasto na sua produção. Por
isso esse capital extra é denominado mais-valor (BRAGA, 2010a, p. 43-44).
Nesse sentido,
a força
de trabalho é uma mercadoria particular, completamente diferente dos meios de
trabalho. Enquanto que estes últimos fornecem ao produto o seu valor, a força
de trabalho não só fornece o seu próprio valor como também acrescenta o valor
do trabalho que ela realiza. É criadora de trabalho; e, portanto, de valor. O
seu consumo é produtivo: dá mais do que custou (BARROT, 1977, p. 58).
Percebemos que o modo de produção capitalista se
afirma num modo singular (capitalista) de se produzir mercadorias, porém esse
modo de produção é também um modo de reprodução do capitalismo. O que queremos
dizer é que no processo de produção do lucro via extração de mais-valor, boa
parte do lucro é reinvestida na produção com o intuito de garantir a reprodução ampliada do capital (MARX,
1985a). Todo capitalista individual se vê coagido a ampliar a produção da sua
empresa com investimentos em maquinarias mais eficazes como forma de garantir a
concorrência inter-capitalista, por conseguinte
é nesse sentido que Marx fala da concorrência
como ‘lei coercitiva externa’, ou seja, como uma coerção sobre cada capitalista
individual: esses não apenas são obrigados a acumular, mas têm de fazê-lo
mediante a utilização de procedimentos técnicos novos (...) (SALAMA &
VALIER, 1975, p. 60).
Essa concorrência inter-capitalista acaba por
promover acumulação e concentração de capital, uma vez que as empresas menores
que não conseguem sobreviver à “vida selvagem da concorrência” acabam por falir,
possibilitando, dessa maneira, que haja a monopolização do mercado pelos
grandes complexos industriais. Assim se inicia a fase histórica do capitalismo oligopolista (VIANA, 2009).
Além de investimentos em tecnologia e maquinaria
mais eficiente na garantia da reprodução ampliada do capital, outras formas
foram desenvolvidas pelos capitalistas com esse intuito. Dentre elas podemos
destacar a organização racionalizada do trabalho que possibilita um maior
controle sobre as ações dos operários na fábrica, pois tais ações devem ser direcionadas
exclusivamente à produção de mais-valor (relativo)[2].
Essa foi uma forma de se combater a tradicional “operação tartaruga” realizada
pelos trabalhadores que sempre resistiram ao caráter alienado da produção
capitalista, evitando como uma peste o trabalho. Nas próximas linhas
dedicaremos maior atenção ao processo de produção de mais-valor relativo, pois esse é de extrema importância para
compreender a teoria do regime de
acumulação integral de Nildo Viana.
Começaremos nossa análise sobre a produção de
mais-valor relativo com uma pergunta levantada pelo próprio autor: Como os operários podem produzir mais no
mesmo período de tempo? Historicamente a burguesia vem utilizando duas
principais formas de ampliação da produtividade. Uma forma é a organização
racionalizada do processo de produção a qual os operários passam a ser
minuciosamente controlados, fiscalizados, rigidamente disciplinados,
cronometrados e vigiados pelos especialistas nessa função, espécies de “agentes
carcerários da produção” (BRAGA, 2009). Os horários para utilização do
banheiro, realização de refeições e para saída de fumantes do local da produção
vem sofrendo uma significativa diminuição. Além dessas formas, ainda existe o
sistema de multas por atraso, por destruição de ferramentas, por descuido com
as máquinas, etc. Com isso, a classe capitalista objetiva evitar o desperdício
de tempo necessário para a produção de mais-valor. Outra forma consiste no
constante aperfeiçoamento tecnológico utilizado para o desenvolvimento de
máquinas cada vez mais eficientes e produtivas. Dessa forma, os capitalistas
garantem a ampliação da produtividade operária.
John Eaton, em sua obra Manual de economia política (1965), ainda nos apresenta outra
estratégia capitalista que consiste na forma de pagamento de salários. Segundo
ele,
as formas de pagamento de
salários constituem uma batalha entre o empregador e os sindicatos. Salário-tarefa,
ou seja, salário pago de acordo com a produção proporciona ao capitalista um
meio de obrigar o trabalhador a fazer mais durante o dia de trabalho, já que
disso depende quanto o trabalhador leva para casa. À primeira vista, pode
parecer que o pagamento de salários-tarefa contradiz o que dissemos
anteriormente sobre os salários e o valor da força de trabalho, como
correspondendo aproximadamente ao valor dos meios de subsistência do
trabalhador. O pagamento “por peça”, ou seja, de acordo com a produção, sugere
que quando esta se eleva, os salários se elevarão de forma correspondente. Isso
só ocorre a prazo muito curto. A experiência de muitas décadas mostrou aos
trabalhadores que os salários-tarefa são, no final, fixados em preços baseados
em salário-tempo, e na soma de artigos que o trabalhador deve comprar para
viver. Se a produção aumenta acentuadamente, então o preço pago unitariamente é
logo reduzido. O salário-tarefa de todo um dia de trabalho pode, é certo, ser
um pouco mais do que o salário-tempo do dia, mas a isso se contrapõe o fato de
que a maior intensidade de trabalho aumenta as necessidades do trabalhador.
Para o capitalista, porém, é compensador pagar pelo trabalho executado, já que
essa produção extra aumenta o volume de mais-valia numa proporção que excede
consideravelmente qualquer extra pago em salários (EATON, apud VIANA, 1965, p.
63).
A disputa pelo controle
do tempo de trabalho representa um dos fundamentos da luta de classes entre a
burguesia e o proletariado na sociedade capitalista, pois se o interesse da
burguesia é ampliar o tempo de trabalho dedicado à produção de mais-valor, o interesse
do proletariado é diminuí-lo. Por isso, a burguesia se vê coagida a desenvolver
formas cada vez mais eficazes de controle sobre o trabalho operário, enquanto
esse se vê também coagido a desenvolver formas de lutas que avancem em direção
à diminuição do tempo de trabalho para extração de mais-valor. Conseqüentemente,
isto ocorre devido ao fato de que
é no próprio processo de trabalho, simultaneamente processo de valorização, que
se dá a produção de mais-valor. Desta forma, o trabalhador, ao resistir em
utilizar toda a sua capacidade de trabalho, tende a diminuir a extração de
mais-valor. É por isso que surge uma luta nas unidades de produção, em que o
capitalista busca controlar a força de trabalho para que ela não desperdice tempo e, por conseguinte, faça
decair o seu lucro (VIANA, 2009, p. 49).
Nesse sentido, é
possível afirmar que o desenvolvimento e sucessão dos regimes de acumulação
equivalem ao desenvolvimento de determinadas formas, relativamente estabilizadas,
de extração de mais-valor, consolidadas em determinadas formas de organização
do trabalho tais como, o taylorismo, fordismo e toyotismo.
Vale lembrar que a luta
operária pelo controle e diminuição do tempo de trabalho destinado à produção
de mais-valor representa apenas o primeiro momento da luta operária, ou seja, essa
luta equivale ao momento imediato da luta de classes. Contudo, o interesse de classe do proletariado se
funda na tendência em eliminar a existência do mais-valor na sua totalidade (VIANA,
2008).
De acordo com Viana, a
luta de classes no processo de produção é mediada por um conjunto de relações
que existem tanto dentro quanto fora do processo diretamente produtivo. Para
ele, a luta em torno do processo de produção de mais-valor é a determinação
fundamental do enfrentamento entre a classe capitalista e a classe operária no
processo de produção de mercadorias (VIANA, 2009). No entanto, esse
enfrentamento se expande para outras esferas das relações sociais. Basta
percebermos que o conflito que se inicia no século XIX entre capitalistas e
operários em torno da diminuição da jornada de trabalho operária
(aproximadamente de 16 horas diárias) resulta numa alteração jurídico-institucional
que possibilita sua redução para 10 horas diárias e, posteriormente, 08 horas
diárias. É nesse contexto que se inicia a reação burguesa para evitar a redução
da taxa de mais-valor, respondendo com a “organização científica do trabalho”
elaborada por Friedrich Taylor em sua obra Princípios
da Administração Científica (1987).
O regime de acumulação extensivo que prevaleceu desde a
revolução industrial até fins do século XIX foi marcado pelo predomínio da
extração de mais-valor absoluto, presente nas prolongadas jornadas de trabalho,
na exploração de trabalho infantil e feminino, nas péssimas condições de
trabalho e moradia e nos míseros salários. Em resposta a essas péssimas
condições de trabalho e vida o proletariado radicaliza suas lutas multiseculares e pressiona a
burguesia a fazer algumas concessões. Tais concessões resultam, principalmente,
em uma drástica redução das jornadas de trabalho (MARX, 1985).
O resultado negativo disso
para o processo de acumulação é visível, pois a redução da jornada de trabalho
significa a redução da extração de mais-valor absoluto e, conseqüentemente, a
burguesia se vê obrigada a reagir. A partir desse momento é que a classe
capitalista sente necessidade de elaborar de forma consciente e racionalizada
uma forma de se combater a tendência declinante da taxa de lucro. Destarte,
a obra de Friedrich Taylor
representa a tentativa de realizar um aumento da produtividade, ou seja, de
extração de mais-valor, através da organização do trabalho. A chamada
‘organização científica do trabalho’, ou simplesmente taylorismo, é o primeiro
passo para se conseguir combater a tendência da queda da taxa de lucro médio
(Ibid, 2009, p. 65).
A proposta de Taylor
visa aumentar a produtividade do trabalho mesmo com a redução das jornadas e para
isso foi necessário uma intensificação do controle e vigilância sobre os
operários a partir de diversas artimanhas, entre as quais podemos destacar:
produção rigidamente cronometrada, divisão entre elaboração e execução de
tarefas, premiação individual por produtividade, formação de especialistas para
a gerência etc. (TAYLOR, 1987).
Como todo processo de
produção de mercadorias é marcado pelo confronto entre as classes antagônicas,
é claro que a ação de uma gera a reação da outra, assim, o proletariado tendeu
a reagir ao taylorismo. O próprio Taylor afirma em sua obra que por diversas
vezes recebeu ameaça de morte. Desse modo, constata-se que o taylorismo
representou a tentativa da burguesia ampliar a extração de mais-valor relativo,
recorrendo à racionalização do processo produtivo num período histórico em que
o desenvolvimento tecnológico é incipiente.
Viana reconhece que o
taylorismo fornecerá a base para as demais formas de organização do trabalho em
períodos posteriores, entretanto ele não visualiza nenhuma mudança
significativa nessas demais formas. Para ele,
as alterações implantadas pelo
fordismo, por exemplo, referem-se a questões superficiais e são provocadas pelo
desenvolvimento histórico do capitalismo. O contexto histórico do fordismo remete
ao aceleramento de desenvolvimento tecnológico em relação ao período anterior
(Ibid, 2009, p. 67).
Quanto ao toyotismo, existem diversas teorias que
afirmam existir uma continuidade entre ambos os sistemas de organização do
trabalho, enquanto outras dizem que há uma ruptura entre eles. Para Viana,
mesmo entre o toyotismo e as formas de organização do trabalho que o antecedem
não há nenhuma ruptura, pois para ele o toyotismo segue a mesma lógica dos
anteriores e as diferenças existentes são meramente secundárias. Para comprovar
essa tese o autor sintetiza uma definição do taylorismo e a compara com o
toyotismo.
Resumidamente, Viana concebe a organização do
trabalho arquitetada por Taylor da seguinte forma:
o
taylorismo, tal como o concebemos, caracteriza-se por um processo de controle
da força de trabalho realizado segundo uma forma “racionalizada”, ou seja,
calculada, medida, normatizada, objetivando o aumento da produtividade, isto é,
de extração de mais-valor relativo, e isto pressupõe a “gerência científica”, o
que significa não só a aplicação do conhecimento técnico-científico ao processo
de produção, conhecimento este extraído em parte do próprio saber operário,
como também a existência dos gerentes,
ou seja, conjunto de especialistas encarregados em planejar a execução das
tarefas. Em outras palavras, o taylorismo pressupõe uma camada de burocratas: a
burocracia empresarial. O fordismo e as demais formas de organização do
trabalho também possuem a mesma razão de ser e por isso não são nada mais do
que extensões e adaptações do sistema Taylor às necessidades históricas de
determinado estágio de desenvolvimento do modo de produção capitalista (Ibid,
2009, p. 68).
Segundo alguns teóricos, a diferença essencial entre
fordismo e toyotismo consiste no fato de que o primeiro era marcado pela
rigidez enquanto o segundo funda-se na sua capacidade flexível. Mas isto não é
suficiente para contradizer as características fundamentais que estão presentes
no fordismo. No fundo, a grande mudança apresentada pelo toyotismo está no fato
da sua produção se encontrar submetida à demanda do mercado, enquanto no
fordismo a produção era uma produção em
massa.
Na
verdade o que ocorre é que a produção estandardizada
do fordismo se vê substituída por uma produção
personalizada , ou seja, a produção em massa ou em série de um mesmo
produto é substituída por uma produção variada. Isso não impede a produção em
massa, pois apenas personaliza os produtos por cotas, ou seja, a produção em
massa deixa de ser de apenas um produto
para ser de vários produtos (Ibid,
2009, p. 68-69).
Uma reflexão importante levantada por Viana nesse
momento da análise, trata da sua crítica à expressão “flexível” e/ou
“flexibilização”. Para ele, o conceito “flexível” não expressa a realidade
concreta a qual ele deveria expressar. Primeiramente, tal conceito possui
inúmeros significados nos dicionários (“aptidão para variadas coisas ou
aplicação” ou “submissão e docilidade”, por exemplo). Esse duplo sentido da
palavra é suficiente para percebermos que sua utilização também revela
ambigüidades tais como falar em “especialização flexível”, “acumulação
flexível” e “flexibilização dos trabalhadores”. O termo flexibilização “se
refere na maioria dos casos, a aptidão múltipla” (Ibid, 2009, p. 70).
Não seria o caso de questionarmos se ao contrário do
que é comumente afirmado e aceito, ou seja, da existência de uma
“flexibilização” do aparato produtivo e dos trabalhadores, na verdade o que
existe não seria uma INflexibilidade,
pois tanto o aparato produtivo quanto os trabalhadores são submetidos “inexoravelmente” e “implacavelmente” ao objetivo de aumentar a extração de mais-valor
relativo? (VIANA, 2009).
Para quem conhece o rigor teórico-metodológico
presente no pensamento desse autor, e que pode ser compreendido de forma
aprofundada nas suas principais obras que levantam preocupações desse cunho (A consciência da História – ensaios sobre o
materialismo histórico-dialético, 2007; Escritos
metodológicos de Marx, 2007a), logo perceberá que essa crítica ao termo
“flexibilização” não é secundária, pois se existe apenas uma realidade (nesse
caso a acumulação capitalista na contemporaneidade), o conceito que busca
expressá-la não deveria ser equivalente a ela? Para Viana, a resposta é só uma:
sim, todo conceito deve ser expressão da realidade, pois “a expressão mais
adequada a qualquer relação ou fenômeno social deve ser compatível com seu
‘ser’ que expressa” (Ibid, 2009, p. 70). Aqui, portanto, reside o fundamento da
sua teoria do regime de acumulação
integral, isto é, o regime de acumulação dominante a partir da década de 1980
se baseia numa acumulação capitalista integral. Mas, deixemos que o próprio
autor apresente sua tese:
no caso
da acumulação, o que se busca é concretizar uma acumulação integral, simultaneamente intensiva
e extensiva através da extensão do
processo de mercantilização das relações sociais e da busca de ampliação do
mercado consumidor, mesmo que esta busca se caracterize, em parte, pela
produção personalizada, e também pelo aumento da intensificação da exploração
da força de trabalho através do aumento de extração de mais-valor relativo e
absoluto. No caso da especialização ou do que alguns chamam de pluri-especialização (Coriat), trata-se de uma especialização ampliada, onde ao invés do trabalhador
se dedicar a apenas uma atividade passa a se dedicar a várias, embora se
mantenha afastado do controle do processo de trabalho, o que significa
especialização no processo de execução, e continue não executando certas
funções práticas que ficam a cargo de outros trabalhadores. No caso dos
trabalhadores, o que ocorre é uma intensificação
da exploração com a retirada de seus direitos já conquistados e da formação de
um mercado de trabalho inflexível,
onde os trabalhadores se submetem a subcontratação, ao desemprego, etc. No caso
da subcontratação (bem como no caso das horas extras), o que se vê é um aumento
disfarçado da jornada de trabalho, o que significa aumento de extração de
mais-valor absoluto. Aliás, mais-valor relativo e mais-valor absoluto andam
juntos no período de acumulação integral, embora isto seja constante no
capitalismo, mas agora assume proporções intensas, tal como não ocorria há
muito tempo na história do capitalismo (Ibid, 2009, p. 70-71).
Segundo Viana, várias podem ser as razões que
explicam esta confusão na linguagem e uma das principais apontam para a
carência de uma teoria sobre a atual fase do capitalismo mundial e das formas
de organização do trabalho assumidas na contemporaneidade. Mas, em outros casos
essa confusão revela um discurso ideológico que através da suavização com as
palavras acaba por facilitar que um véu nebuloso desça e ofusque a
possibilidade de uma consciência correta da realidade. Nesse sentido, portanto,
percebe o quanto o discurso da “flexibilização” serve aos interesses das
classes capitalistas uma vez que a existência de trabalhadores moldáveis e
mercados flexíveis contribuem para essas novas exigências da acumulação
integral. Já para o proletariado tal “flexibilização” representa apenas uma
exploração integral.
Constata-se que Viana não vê nenhuma diferença
significativa entre taylorismo e toyotismo. Para ele, a suposta
“flexibilização” da empresa visando subordinar-se à demanda do mercado “se
revela numa mudança no quanto se produzir,
e não no que e como se produzir. Pensar o contrário só seria possível
imaginando que o consumidor iria idealizar um produto ainda inexistente e
depois iria solicitá-lo à empresa” (Ibid, 2009, p. 72).
A produção personalizada representa a forma que as empresas encontraram para
ampliar e conquistar o mercado consumidor através de suas agendas de
publicidade e marketing, pois “para manter a
reprodução ampliada do capital é preciso garantir a reprodução ampliada do
mercado consumidor, e isto implica produzir necessidades fabricadas, já que estas
realizam esta ampliação (Ibid, 2009, p. 72).
Em síntese o toyotismo representa uma adaptação do
taylorismo à nova fase do capitalismo, no período de vigência do regime de
acumulação integral, expressando uma ofensiva do capital contra a tendência
declinante da taxa de lucro, e isto tem representado para a classe trabalhadora
um processo de exploração integral visto que, no processo de produção, e
derivado da sua condição atual, tem promovido uma extensão das jornadas de
trabalho, uma intensificação alucinante do ritmo de trabalho, ampliação da
psicopatologia do trabalho etc. Isso para mencionarmos apenas as conseqüências diretas
da produção de mais-valor, fora as demais conseqüências, tais como, o crescente
processo de lumpemproletarização (comprovado com o crescimento generalizado do
desemprego em escala global) e a criminalização de suas vítimas pelo Estado
Penal etc. (WACQUANT, 2001; BRAGA, 2010)[3].
Todavia, a acumulação integral não soluciona os
problemas do capitalismo, pois se por um lado ela combate a tendência
declinante da taxa de lucro, por outro lado, aumenta a exploração e promove um
amplo processo de lumpemproletarização. Assim, tal regime de acumulação tende a
possibilitar o crescimento da radicalização das lutas sociais que acaba colaborando
para o enfraquecimento da hegemonia burguesa na sociedade civil. “Nesse
sentido, a acumulação integral é contraditória e só se mantém enquanto perdurar
a hegemonia burguesa, com toda a sua fragilidade em períodos como este” (Ibid,
2009, p. 76).
No primeiro momento desse texto, discutimos a
produção capitalista de mercadorias e suas múltiplas determinações,
posteriormente, discutimos uma das partes constituintes do regime de
acumulação, ou seja, a forma de sua organização do trabalho no regime de
acumulação integral (o toyotismo). A partir de agora iremos discutir sua forma
de organização estatal: o Estado neoliberal.
Antes de iniciarmos a discussão sobre a emergência
do Estado neoliberal e sua dinâmica, gostaríamos de apresentar brevemente a
singularidade da análise de Viana sobre o papel do Estado como agente
regularizador das relações sociais na sociedade capitalista. Para Viana, é
emergencial a construção de um conceito adequado que dê conta de expressar
teoricamente a complexa relação que existe entre modo de produção e Estado.
Tradicionalmente, a corrente “marxista” adota a metáfora do “edifício social” –
infra-estrutura e superestrutura – para analisar essa relação, no entanto, tal
metáfora não é satisfatória, pois segundo a perspectiva do materialismo
histórico-dialético tanto o termo infra-estrutura quanto o termo superestrutura
não consistem em conceitos, ou seja, não expressam nenhuma realidade[4].
Viana propõe a adoção do conceito de formas de regularização das relações sociais[5]
que segundo ele englobaria, assim como na concepção de Marx, o estado, as
instituições estatais e privadas, as normas legais, a sociabilidade, as
ideologias e a cultura em geral etc. que procuram tornar regular, além da
produção, as relações sociais oriundas do modo de produção capitalista. Nesse
sentido, afirmamos que todo regime de acumulação vem acompanhado de
determinadas formas de regularização das
relações sociais e da produção que lhe são próprias. É a partir dessa
compreensão que analisaremos a principal forma de regularização das relações
sociais do regime de acumulação integral que, nesse caso, consiste no Estado
neoliberal.
Um equívoco comumente cometido por vários autores
que discutem o neoliberalismo consiste em confundir a emergência da ideologia
neoliberal com a emergência do próprio Estado neoliberal. Em 1944 surge a
ideologia neoliberal com a obra Os
caminhos da Servidão de F. Hayek, no entanto a forma estatal dominante
nesse período até aproximadamente a década de 1980 é o Estado do “bem-estar
social”, portanto, ao contrário do que acreditam determinados autores
(ANDERSON, 2000), não seria possível que o neoliberalismo enquanto forma
estatal pudesse ter surgido com tal obra, nem sequer pode-se afirmar que o
neoliberalismo consistiu meramente na aplicação de tal ideologia na prática.
A tese desenvolvida por Viana afirma que o Estado
neoliberal, que emerge a partir da década de 1980, é resultado de um “conjunto
de transformações no modo de produção capitalista, expressando uma alteração no
seu regime de acumulação” (VIANA, 2009). Segundo ele, para se compreender o
neoliberalismo além de suas características aparentes é preciso inseri-lo na
totalidade das relações sociais, analisar sua determinação no atual momento
histórico, o desenvolvimento capitalista e a luta de classes que vêm se
desenvolvendo nas últimas décadas. Vale ressaltar que a luta de classes é a
determinação fundamental das mudanças ocorridas nos regimes de acumulação e que
a mesma está presente nas três partes constituintes de tais regimes.
A emergência do neoliberalismo só pode ser
compreendida se inserida nas transformações ocorridas a partir da década de
1960/70 nos países capitalistas imperialistas (EUA e algumas nações européias).
Na década de 1950 surge no Japão o sistema Toyota, isto é, a forma de
organização do trabalho necessária para combater a tendência declinante da taxa
de lucro e promover uma nova fase de valorização do capital. O processo baseado
nessa forma de organização foi chamado de “reestruturação produtiva” e se
generalizou mundialmente nos países capitalistas imperialistas. Com isso é
engendrado um novo regime de acumulação que exige outra formação estatal que
regularize as novas necessidades do capital. Assim nasce o neoliberalismo.
Uma questão nos parece instigante, pois para que um
novo regime de acumulação possa emergir é necessário que o anterior entre em
crise, portanto em que consiste essa crise, ou seja, qual o significado da
crise do regime de acumulação intensivo-extensivo para a emergência do regime
de acumulação integral e, conseqüentemente, do Estado neoliberal?
As décadas de 60 e 70 do século XX é marcada por uma
crise do regime de acumulação intensivo-extensivo resultada pela tendência declinante da taxa de lucro médio[6].
Tal tendência foi expressa em diversas dificuldades encontradas para a
reprodução capitalista, pois
o
sucesso deste regime de acumulação dependia do alto grau de exploração dos
trabalhadores do capitalismo subordinado, da constante reprodução ampliada do
mercado consumidor e da integração da classe operária no capitalismo
oligopolista transnacional, elemento que dependia dos dois anteriores. A partir
do final da década de 60, estes três elementos encontraram dificuldades
crescentes em se reproduzir (VIANA, 2003, p. 92).
Juntamente com essas dificuldades passavam a crescer
as ondas de greves operárias, destaque para as francesas e italianas que
atingiram grau elevado de radicalidade, e várias tensões sociais derivadas da
organização e manifestação de diversos grupos, tais como o movimento de
contracultura, o movimento hippie, o pacifismo, o movimento negro
norte-americano, o movimento feminista, o movimento estudantil etc., além dos
conflitos ocorridos nos países de capitalismo subordinado (dito “terceiro
mundo”). Esse quadro de tensões sociais contribuiu para o agravamento da crise
de acumulação do regime de acumulação intensivo-extensivo que desde a década de
60 se encontrava com sérias dificuldades.
Outras abordagens acrescentam a esse quadro a
contribuição que outros fatores deram para o agravamento da crise, entre eles
destacam-se
os
efeitos da decisão da OPEP de aumentar os preços do petróleo e da decisão árabe
de embargar as exportações de petróleo para o Ocidente durante a guerra
árabe-israelense de 1973. Isso mudou o custo relativo dos insumos de energia de
maneira dramática, levando todos os segmentos da economia a buscarem modos de
economizar energia através da mudança tecnológica e organizacional (...)
(HARVEY, 2008, p. 136).
A necessidade da burguesia em engendrar um novo
regime de acumulação vem acompanhada da necessidade de uma nova forma estatal
que o torne regular. É nesse sentido, portanto, que o Estado neoliberal emerge,
ou seja, como um complemento que atenda as novas necessidades do capital, pois
o combate à tendência declinante da taxa de lucro passa pela criação de
condições para o aumento da extração de mais-valor e isto só seria possível
ampliando a extração tanto em escala nacional quanto em escala internacional,
ou seja, ampliando a exploração de forma integral. Desse modo, o Estado
neoliberal complementa o processo de “reestruturação produtiva” criando as
condições institucionais indispensáveis para o aumento da acumulação
capitalista.
A partir da década de 1980 diversos governos
neoliberais chegaram ao poder. A eleição de Margareth Tatcher em 1979 na
Inglaterra, Ronald Reagan em 1980 nos EUA e Helmuth Kohl em 1982 na Alemanha.
Daí por diante, paulatinamente, diversos outros países adotaram políticas
neoliberais e, conseqüentemente, surge um período de expansão das
privatizações, de desregulamentação dos mercados e das relações de trabalho,
ajustes fiscais e monetários, precarização e intensificação do trabalho,
ampliação da lumpemproletarização e da repressão etc.
Em suma, o Estado neoliberal chega para varrer os
direitos trabalhistas, precarizar as condições de trabalho possibilitando
contratos temporários, terceirização, subcontratação, aumento do desemprego,
exploração do trabalho infantil, cortes drásticos nas políticas sociais,
aumento da insegurança social com a expansão da criminalidade e da repressão
pelo “Estado Penal” e um amplo processo de empobrecimento em escala global via
processo de lumpemproletarização. Por conseguinte, o Estado neoliberal cria as
condições “legais” para a construção de um mundo de “exploração sem limites”
(BOURDIEU, 1998).
Neste
sentido, podemos dizer que o Estado neoliberal está atingindo seus propósitos,
pois vem contribuindo para o aumento da exploração e recuperação da acumulação
capitalista, tanto a nível nacional quanto a nível internacional. Podemos
dizer, resumidamente, que o neoliberalismo é uma nova forma estatal que surge
nos anos 80, sendo produto do regime de acumulação integral, e que busca
diminuir os gastos estatais, desregulamentar o mercado, subsidiar o capital
oligopolista e aumentar a política repressiva, facilitando assim o
desenvolvimento da reestruturação produtiva e da instauração de novas relações
internacionais. As conseqüências do neoliberalismo são o aumento da pobreza e
miséria, da desigualdade, da criminalidade e dos conflitos sociais. O mundo
neoliberal é um mundo marcado por contradições crescentes (VIANA, 2009, p. 91).
Viana define regime de acumulação da seguinte
maneira, “um regime de acumulação é um
determinado estágio do desenvolvimento capitalista, marcado por determinada
forma de organização do trabalho (processo de valorização), determinada forma
estatal e determinada forma de exploração internacional” (2009, p. 30).
Em linhas gerais essa é a compreensão que o autor tem de um regime de
acumulação, no entanto é necessário pormenorizar outros elementos que envolvem
a dinâmica dessa tese do desenvolvimento capitalista.
Todo processo de valorização expressa uma correlação
de forças entre a burguesia e o proletariado em determinado momento histórico,
isto é, expressa certo estágio da luta de classes. É claro que tal luta de
classes tem apontado, até então, para a preeminência do projeto societário da
burguesia, pois caso contrário, as relações de produção capitalistas estariam
abolidas ou prestes a serem abolidas. Todavia, tal preeminência não é absoluta,
pois a luta cotidiana e espontânea do proletariado tende a criar obstáculos e
recuos para o desenvolvimento de uma exploração cada vez maior no processo de
acumulação. Dessa forma, a luta de classes no capitalismo se apresenta relativamente
estável já que a ofensiva operária, apesar de vários momentos de radicalidade
na história, não conseguiu abolir as relações de produção capitalistas.
As formas estatais que a sociedade capitalista
conheceu também expressa uma correlação de forças entre as duas classes
fundamentais do capitalismo, assim como de outras classes sociais, em períodos
históricos específicos. Isso pode ser percebido, por exemplo, nas conquistas
operárias e camponesas que possibilitaram alterações nas legislações
capitalistas, criação de leis trabalhistas, indenizações etc. Mas nesse caso a
luta de classes também se expressa de forma relativamente estável. Do mesmo
modo, a exploração internacional se apresenta como expressão da luta de classes
mediada pelos Estados Nacionais. Ela aponta, em cada estado-nação, a correlação
de forças entre as classes sociais internas que influenciam as relações
internacionais e define determinadas características de uma nação nessas
relações (VIANA, 2009).
o
regime de acumulação, portanto, é a forma que o capitalismo assume durante o
seu desenvolvimento. O desenvolvimento capitalista, no entanto, possui uma
tendência, determinada em sua própria essência: a produção de mais-valor. O
desdobramento da produção de mais-valor é a acumulação de capital e este, por
sua vez, gera a reprodução ampliada e a centralização e concentração do
capital, gerando a expansão mundial do capitalismo e a exploração
internacional, ao lado da ação estatal no sentido de garantir todo este
processo (Ibid, 2009, p. 31).
A partir de agora discutiremos a terceira e última
parte constituinte de um regime de acumulação, isto é, o neoimperialismo. O
capitalismo só existe em expansão, pois vimos que a sobrevivência dos
capitalistas individuais depende da capacidade desses de concorrer no mercado e
essa depende da habilidade de desenvolver as forças produtivas, de combater a
tendência à queda da taxa de lucro, da concentração e centralização de capitais
que possibilita a formação dos verdadeiros oligopólios que passam a dominar os
mercados mundiais. Aqui reside a “marcha global do capitalismo”. Contudo, como
já foi mencionado, esse processo é marcado pela luta de classes em sua
totalidade e pela tendência declinante da taxa de lucro que historicamente tem
obrigado as classes capitalistas a encontrarem novas estratégias de combater
esses dois impasses para o desenvolvimento dessa marcha. Isso tem gerado o
desenvolvimento e sucessão dos regimes de acumulação que há cada sucessão
encontra dificuldades cada vez maiores para reproduzir o capitalismo. É nesse
sentido que Viana afirma que o regime de acumulação integral necessita, como
seu próprio nome diz, da ampliação da exploração em escala cada vez mais
intensa.
O regime de acumulação intensivo-extensivo que
antecedeu ao regime de acumulação integral garantia uma relativa estabilidade
no bloco dos países imperialistas graças à superexploração existente no bloco
dos países subordinados através de uma acumulação extensiva, transferência de
mais-valor para os países imperialistas, endividamento externo, da “troca
desigual” etc. Porém, a situação já não é mais a mesma visto que para garantir
a reprodução do capitalismo no regime de acumulação integral, que entra em
vigor a partir da década de 1980, não basta aumentar a já intensa exploração no
capitalismo subordinado, até mesmo porque as resistências provavelmente
atingiriam níveis de radicalidade não desejado pelas classes capitalistas.
Portanto, para se manter, o novo regime de acumulação necessita aumentar a
exploração no bloco subordinado, que a partir da queda do capitalismo estatal
russo se amplia com os países do leste europeu, mas também no bloco
imperialista.
É neste contexto que emerge o neoimperialismo, ou
seja, o imperialismo do regime de acumulação integral que tem como função
promover de forma generalizada a acumulação integral de capital em todo o
mundo. Dessa forma, o neoimperialismo busca reproduzir o processo de exploração
integral através das relações internacionais, visando aumentar a exploração
que, conseqüentemente, representa maior quantidade de mais-valor produzido e
maiores transferências de valor dos países subordinados para os países
imperialistas.
Deste modo, há uma tendência em aumentar a já
elevada taxa de exploração nos países subordinados. Nesse sentido é que a
política neoliberal cumpre seu papel ao promover uma corrosão dos direitos
trabalhistas e estabelecimento de estratégias para promover o aumento da
extração de mais-valor relativo (maior controle do trabalho, novas tecnologias
etc.), uma vez que a extração de mais-valor absoluto já existe e tende a
ampliar. Portanto,
o
neoimperialismo produz um Estado neoliberal subordinado, que executa o papel de
aumentar a exploração interna e, ao mesmo tempo, permitir o aumento da
exploração externa. A proeminência de organismos internacionais na elaboração
das políticas nacionais dos estados subordinados (FMI, Banco Mundial etc.)
apenas revela esta subordinação e alguns dos mecanismos utilizados pelo bloco
imperialista (e pelo capital oligopolista transnacional por detrás dele). O
bloco subordinado realiza uma política neoliberal que revela a debilidade do
capital nacional e, por conseguinte, das burguesias nacionais, subordinadas ao
mesmo tempo associadas ao capital oligopolista transnacional (a reprodução subordinada
dos capitalismos nacionais permite sua reprodução. O fato de o nível da
exploração dos trabalhadores locais ser maior não lhes interessa) (Ibid, 2009,
p. 105).
Uma das principais características do capitalismo
subordinado é ter seu capital nacional e o Estado submetido ao domínio do
capital transnacional, já nos Estados imperialistas o capital nacional exerce
proeminência sobre o capital transnacional. No capitalismo subordinado seus
capitais são limitados, exercendo de forma bastante tímida qualquer domínio
fora de suas fronteiras nacionais. Já nos países de capitalismo imperialista o
capital nacional é transnacional e sobrepuja o mundo inteiro.
É importante destacar que os organismos
internacionais compõem o processo de regularização da exploração internacional
e que com a mudança para o regime de acumulação integral suas estratégias
sofrem alterações. O Banco Mundial nos fornece um exemplo claro de tais
alterações, pois enquanto no regime de acumulação anterior ele cumpria o papel
de providenciar investimentos, no regime de acumulação integral ele passa a
exercer o papel de “‘guardião dos interesses dos
grandes credores internacionais, responsável por assegurar o pagamento da
dívida externa e por empreender a re-estruturação e abertura’ do capitalismo
subordinado” (SOARES apud VIANA, 2009, p. 111). No fundo, o que
as organizações internacionais têm promovido é a coação dos países subordinados
no sentido dos mesmos aprofundarem seu neoliberalismo, sua reestruturação
produtiva e suas políticas internacionais em direção à construção de um “livre
comércio”, para o capital transnacional é claro. Conclui-se que
o
neoimperialismo é, tal como o regime de acumulação que lhe gerou, integral,
buscando aumentar a transferência de mais-valor do capitalismo subordinado
através de várias formas, além das tradicionais. E desloca investimentos para
locais onde a força de trabalho é mais barata e busca criar nichos exclusivos
de mercado consumidor (veja, no caso dos EUA, a NAFTA, o projeto ALCA etc.), o
que faz acirrar a competição interimperialista. Também há o aprofundamento da
estratégia de emperrar o desenvolvimento das forças produtivas, desviando os
investimentos para bens de consumo, indústria bélica etc. Assim, a dinâmica do
neoimperialismo é marcada por uma busca desenfreada de aumentar a exploração
imperialista, buscando combater a tendência declinante da taxa de lucro (Ibid,
2009, p. 111).
Devido aos limites desse artigo deixaremos de fora a
análise que o autor realiza sobre a
especificidade do imperialismo norte-americano. Esperamos que o pouco da
análise contida nessa breve apresentação que realizamos sobre o neoimperialismo seja suficiente para
estimular a busca pela leitura integral dessa obra que adquire fundamental
importância para a compreensão da dinâmica do capitalismo contemporâneo.
Aproximando-nos do final de nossa apresentação sobre
a teoria do regime de acumulação integral, teceremos nossos últimos
comentários. As tensões sociais derivadas da exploração capitalista promovem a
eclosão de diversas lutas e resistências das classes operárias e de outros
grupos sociais que ameaçam a existência do modo de produção capitalista e
contribui para o agravamento da crise social, pois diante desse perigo as
classes capitalistas e demais classes auxiliares (burocracia estatal e
partidária, por exemplo) são coagidas a recuarem e realizarem diversas
concessões que acabam por emperrar o desenvolvimento do capital em busca de sua
meta essencial que é a extração, cada vez maior, de mais-valor. Além disso,
existe a tendência geral e espontânea da acumulação capitalista de gerar o
declínio da taxa de lucro médio, que, por sua vez, obriga a classe capitalista
a ampliar a exploração com o intuito de combater essa queda.
As crises capitalistas são resultados da
radicalidade desses dois desdobramentos que se reforçam mutuamente, pois
as
conquistas do proletariado interferem na extração de mais-valor, reforçando a
tendência de queda da taxa de lucro e esta tendência, realizando-se e
provocando a ação reativa da classe burguesa no sentido de aumentar a
exploração para compensar tal queda, reforça o descontentamento e a luta do
proletariado. Assim, um tende a reforçar o outro e proporcionar uma crise. Esta
crise ou gera um processo revolucionário e abolição do capitalismo ou então
proporciona um mudança no interior do capitalismo, isto é, uma mudança no
regime de acumulação (Ibid, 2009, p. 31-32).
Os regimes de acumulação, portanto, são formas
assumidas pelo desenvolvimento capitalista e que expressam as configurações
derivadas da luta de classes em determinado contexto histórico e que se
configuram em formas específicas de processo de valorização do capital, formas
estatais e determinadas relações internacionais. Esses são seus principais
elementos definidores. No entanto, a expressão da luta de classes não se resume
nessas formas, uma vez que outras esferas como a cultural, ideológica,
científica, cotidiana etc., também caracterizam relações, valores e
perspectivas de classes antagônicas que são próprias dessa atual configuração do
capitalismo na era da acumulação
integral.
É importante destacar que apesar da história do
capitalismo ser marcada pela sucessão dos regimes de acumulação, isto não deve
nos levar a crer que o modo de produção capitalista tende a solucionar
infinitamente os problemas derivados de sua própria dinâmica, pois o que se
percebe é que a cada novo regime de acumulação a dificuldade em promover a
extração de mais-valor, combater a tendência declinante da taxa de lucro e
reprimir as crescentes lutas sociais e sua disposição, cada vez maior, em se
radicalizar se torna mais difícil. A cada crise de um regime de acumulação a
possibilidade de uma transformação social se abre e mesmo essa não ocorrendo e
um novo regime de acumulação surgindo, o processo de exploração e as
dificuldades de reprodução do capitalismo se tornam mais complicadas (VIANA,
2009).
Duas são as tendências possíveis para o futuro, de
um lado a tendência da burguesia encontrar um novo regime de acumulação que
substitua o integral quando esse se esgotar (as contradições desse regime já
apontam para essa possibilidade e tendência), sustentando-se possivelmente em
Estados totalitários de cunho fascista ou num regime de acumulação baseado no
capitalismo de guerra que se afirma, ao invés da destruição das forças
produtivas cíclicas e nacionais, na destruição das forças produtivas mundiais.
Por outro lado, há a possibilidade de uma revolução proletária oriunda de um
período de lutas sociais que emergem e tendem a se radicalizar, possibilitando
um acúmulo de experiências que levem ao abandono de estratégias ultrapassadas e
ao forjamento de novas estratégias de auto-organização, alianças com classes
que tendem a serem potencialmente aliadas e revolucionárias, fortalecimento de
blocos revolucionários (anarquismo, situacionismo, conselhismo etc.). Tudo isso
tende a corroer a hegemonia burguesa na sociedade civil e aponta para a
possibilidade de uma nova sociedade fundada na autogestão social. Nesse sentido,
uma pergunta permanece viva: autogestão social ou barbárie?
Referências
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WACQUANT, Loic. As prisões da miséria. Rio de
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*
Mestre em Sociologia; Professor de História Contemporânea e História dos
Marginais da Universidade Estadual de Goiás e pesquisador do Núcleo de Pesquisa
Marxista – NPM.
[1] O
conselhismo ou comunismo de conselhos nasceu no início do século XX
concomitante à ascensão das lutas revolucionárias do proletariado europeu e,
assim como o marxismo original (Marx e Engels), procurou ser expressão teórica
do movimento revolucionário do proletariado (Korsch). Nesse sentido, essa corrente
teórica parte da perspectiva do proletariado para compreender a realidade
concreta, ao contrário das vertentes pseudo-marxistas (reformismo
social-democrata, leninismo e seus derivados) que são expressões ideológicas da
burocracia estatal e partidária.
[2] “A mais-valia produzida pelo prolongamento da
jornada de trabalho chamo de mais-valia absoluta; a mais-valia que, ao
contrário, decorre da redução do tempo de trabalho e da correspondente mudança
da proporção entre os dois componentes da jornada de trabalho chamo de
mais-valia relativa” (MARX, 1985, p. 251); “O desenvolvimento da força
produtiva do trabalho, no seio da produção capitalista, tem por finalidade
encurtar a parte da jornada de trabalho durante a qual o trabalhador tem de
trabalhar para si mesmo, justamente para prolongar a outra parte da jornada de
trabalho durante a qual pode trabalhar gratuitamente para o capitalista. Até
que ponto pode-se alcançar ainda esse resultado sem baratear as mercadorias,
mostrar-se-á nos métodos particulares de produção da mais-valia relativa (...)”
(Ibid, 1985, p. 255).
[3] Sobre a
relação entre o regime de acumulação integral e o processo de criminalização do
lumpemproletariado Cf. (BRAGA, 2010).
[4] Karl
Marx “utilizou o par conceitual infra-estrutura e superestrutura, ao que tudo
indica, apenas uma vez, num prefácio que ele mesmo qualificou de ‘resumo geral’
que serviu de ‘fio condutor’ para suas pesquisas. Toda uma tradição posterior,
auto-intitulada ‘marxista’, transformou este par conceitual em ‘esquema básico’
do ‘materialismo histórico’. Coube a Karl Korsch, uma rara exceção, o mérito de
romper com esse esquematismo. Ele afirmou que o materialismo 7 é um
‘instrumento heurístico’ e, assim, superou, implicitamente, a tese da relação
esquemática entre ‘base’ e ‘superestrutura’ (VIANA, 2007, p. 69); “Essa
tendência de transformação da metáfora ilustrativa em metáfora normativa é
reforçada pela não elaboração de um conceito que expresse o referente material
da noção de superestrutura. A construção do texto de Marx deixa claro as
relações existentes entre as duas noções: elevação, constituição,
correspondência, condicionamento, determinação, contradição, alteração etc., e
outras no interior delas: correspondência, desenvolvimento, contradição,
transformação etc. Isto comprova a existência de uma relação concreta entre as
duas noções, mas estas não podem possuir uma relação verdadeiramente concreta,
porquanto não são conceitos e sim noções ou constructos que não manifestam
nenhuma realidade, apenas ilustram uma relação entre elementos desta” (Ibid,
2007, p. 71).
[5] Sobre a
teoria das formas de regularização das relações sociais Cf. (VIANA, 2007).
[6] “Esta tendência é constituída devido ao
desenvolvimento das forças produtivas, pois quanto mais desenvolvida é a
tecnologia e quanto mais esta entra no processo de produção, menos se utiliza a
força de trabalho, que é a fonte geradora de mais-valor” (VIANA, 2009, p. 93).
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